«A violência resultou de uma conspiração de grupos locais e estrangeiros»
A tentativa falhada de 19 de Março de 1959 O Tibete e a comemoração do «levantamento» da CIA
Published Apr 8, 2008 8:22 PM
http://www.avante.pt/noticia.asp?id=24053&area=11
Gary Wilson*
O Tibete ter-se-á tornado na vanguarda de uma nova luta de
libertação nacional? Ou será que o que ali se está a passar
é outra coisa?
Os órgãos de comunicação social dos EUA estão
cheios com os acontecimentos que se estão a passar no Tibete. Cada
reportagem, no entanto, parece ter sempre uma nota dizendo que muito do que
está a ser reportado não pode ser confirmado. As fontes dos
repórteres são obscuras e desconhecidas. Se as práticas do
passado são um indício, é provável que o Departamento de
Estado e a CIA sejam as primeiras fontes.
Uma fonte citada com frequência é John Ackerly. Quem é John
Ackerly? Como presidente da Campanha Internacional para o Tibete, ele e o seu
grupo parecem trabalhar estreitamente com o governo dos EUA, com o Departamento
de Estado e com o Congresso no âmbito das suas operações
relacionadas com o Tibete. Durante a Guerra Fria, a função de Ackerly
era trabalhar com os «dissidentes» na Europa de Leste,
particularmente na Roménia em 1978-80.
Uma agência privada de segurança internacional radicada em
Washington, a Harbor Lane Associate, conta com Ackerly e com a Campanha
Internacional para o Tibete como seus clientes, tal como sucede com o
ex-director da CIA e com o presidente norte-americano George H. W. Bush e com o
ex-chefe do Pentágono, William Cohen.
A Associated Press, a Reuters e demais agências ocidentais, citam
todas Ackerly como a sua fonte mais importante para as exageradas reportagens
sobre os conflitos que estão a ocorrer no Tibete. Por exemplo, a MSNBC
reportou em 15 de Março:
«John Ackerly, da Campanha Internacional para o Tibete, um grupo que
apoia as reivindicações de autonomia do Tibete, disse numa
declaração enviada por correio electrónico temer que
“centenas de tibetanos tenham sido detidos e estejam a ser interrogados e
torturados”».
Uma versão diferente
Qiangba Puncog, o tibetano que preside ao Governo Regional Autónomo
do Tibete, descreveu a situação de uma maneira muito diferente
durante uma conferência de imprensa em Pequim, a 17 de Março.
Segundo china.org.cn, o portal da China na Internet, o líder tibetano
disse que, em 14 de Março, pessoas aliadas ao exilado Dalai Lama
«participaram em distúrbios, roubos, destruições e
incêndios irresponsáveis e que as suas actividades logo se estenderam
a outras partes da cidade. Essa gente escolheu como alvo as lojas de rua,
escolas primárias e secundárias, hospitais, bancos,
instalações de electricidade e comunicações, e meios de
comunicação social. Incendiaram veículos que circulavam,
perseguiram e agrediram os passageiros na rua, e assaltaram lojas,
serviços de telecomunicações, e edifícios governamentais.
Da sua acção resultaram danos sérios à vida e à
propriedades dos habitantes locais, e perturbaram gravemente a ordem em
Lhasa.
«Treze civis inocentes foram queimadas ou apunhalados mortalmente no
motim de 14 de Março em Lhasa, e 61 polícias ficaram feridos, seis
dos quais gravemente», disse Qiangba Puncog.
«Os dados mostram também que os amotinados incendiaram mais de
300 localidades, incluindo casas residenciais e 214 lojas, e destruíram e
queimaram 56 veículos.
(...) «Qiangba Puncog disse ainda que o pessoal de segurança
não levava nem usava nenhuma arma letal quando enfrentou os desacatos
daquela sexta-feira».
«A violência foi o resultado de uma conspiração de
grupos locais e estrangeiros que advogam a “independência do
Tibete”», segundo Qiangba Puncog. «A camarilha do Dalai
concebeu, planeou e organizou cuidadosamente os distúrbios».
«Segundo Qiangba Puncog, há 49 anos, a 10 de Março, os
donos de escravos do velho Tibete lançaram uma rebelião armada com o
propósito de dividir o país. Essa rebelião foi neutralizada
rapidamente. Todos os anos, desde 1959, alguns separatistas dentro e fora da
China promovem actividades para assinalar esse dia».
(...) «Nenhuma tentativa secessionista para sabotar a estabilidade do
Tibete terá apoio popular e estará sempre condenada ao
fracasso», disse.
Reunião em Nova Deli
O que está a acontecer no Tibete foi preparado há muito tempo.
Em Junho passado, realizou-se uma conferência em Nova Deli, na Índia,
patrocinada por «Os amigos do Tibete». Foi descrita como uma
conferência para promover a secessão do Tibete.
O sítio noticioso phayul.com reportou na altura em que decorria essa
conferência que «os Jogos Olímpicos podiam fornecer a
oportunidade para que os tibetanos viessem para a rua protestar». Foi
feito um apelo para que se organizassem protestos a nível mundial, uma
marcha de exilados desde a Índia até ao Tibete, e
manifestações dentro do Tibete – tudo ligado às
próximas Olimpíadas de Pequim.
Esse apelo foi seguido de um outro em Janeiro último para um
«levantamento» no Tibete, emitido por organizações sediadas
na Índia. A reportagem de 25 de Janeiro dizia que o «Movimento de
Levantamento do Povo Tibetano» foi criado em 4 de Janeiro para se centrar
nos Jogos Olímpicos de Pequim de 2008. A data para começar o
«levantamento» ia ser o 10 de Março.
Quando foi emitido o apelo, o embaixador norte-americano para a
Índia, David Mulford, estava reunido com o Dalai Lama em Dharamsala, na
Índia. A subsecretária de Estado Paula Dobriansky fez uma visita
semelhante a Dharamsala em Novembro último. Dobriansky é também
membro do Projecto para um Novo Século Americano, uma
organização neoconservadora. E também esteve envolvida nas
chamadas revoluções coloridas na Europa de Leste.
De acordo com a informação de phayul.com, o relatório do
grupo «Levantamento» tibetano diz que está a agir «no
espírito do Levantamento de 1959».
O levantamento de 1959
Saber um pouco mais sobre o que foi o «levantamento» de 1959
pode ajudar-nos a compreender melhor os acontecimentos de hoje no Tibete.
Em 2002, foi publicado pela Imprensa da Universidade do Kansas um livro
intitulado «A guerra secreta da CIA no Tibete». Os dois autores
– Kenneth Conboy da Fundação Heritage, e James Morrison, um
instrutor veterano do exército norte-americano para a CIA –
descrevem orgulhosamente como a CIA organizou e dirigiu o chamado movimento de
resistência do Tibete. O próprio Dalai Lama estava na lista de
pagamentos da CIA e aprovou os seus planos para o levantamento armado.
A CIA encarregou o irmão do Dalai Lama, Gyalo Thodup, do sangrento
ataque armado de 1959. Um exército contra-revolucionário foi treinado
pela CIA no estado do Colorado e depois transportado para o Tibete em
aviões da Força Aérea dos Estados Unidos.
O ataque de 1959 foi uma tentativa de golpe de Estado planeada e
organizada pela CIA, tal como mais tarde a invasão da Baía dos Porcos
contra a Cuba socialista. O objectivo era derrubar o governo tibetano de
então e enfraquecer a Revolução Chinesa, ao mesmo tempo que
amarrava o povo tibetano aos interesses imperialistas norte-americanos. O que
é que isto diz quanto ao facto de o actual levantamento de Março
estar imbuído do mesmo espírito?
(*) Jornalista no Workers World
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